Passo Fundo será palco, no dia 27 de novembro, de uma audiência pública que marcará um movimento decisivo em defesa da cadeia produtiva do leite no Brasil. A iniciativa, proposta pelo deputado Paparico Bacchi, discutirá o Projeto de Lei 412/2025, que proíbe a reconstituição de leite em pó importado para venda como leite fluido no Rio Grande do Sul. O encontro ocorrerá às 14h, no Auditório do Curso de Direito da Universidade de Passo Fundo (UPF), reunindo lideranças políticas, cooperativas, produtores e entidades representativas do setor.
O setor vive um cenário crítico. Nos últimos anos, o Brasil praticamente triplicou a importação de leite em pó, principalmente da Argentina e do Uruguai. Em menos de uma década, o Rio Grande do Sul registrou queda acentuada na produção, passando de 4,22 bilhões de litros em 2015 para 3,84 bilhões em 2024, conforme dados do IBGE. Desde 2018, mais de quarenta mil propriedades deixaram de produzir leite no Estado, muitas delas por inviabilidade financeira diante da concorrência com o produto importado.
A crise se aprofundou após a redução da tarifa de importação do leite em pó, que caiu de 11,2% para 4% por decisão da Câmara de Comércio Exterior em 2023. A medida abriu espaço para uma entrada massiva de leite estrangeiro no país. Apenas em 2024, o Brasil recebeu volume suficiente para encher cerca de dois bilhões de caixinhas de leite de um litro. Nos primeiros quatro meses de 2025, outros 750 milhões de litros chegaram ao país, muitos provenientes de mercados onde a produção é fortemente subsidiada. Enquanto isso, milhares de produtores brasileiros passaram a vender abaixo do custo. No Rio Grande do Sul, entre maio e agosto, período em que normalmente o valor sobe, o preço pago ao produtor caiu cerca de sessenta centavos por litro.
A consequência é sentida diretamente no campo. Segundo a Emater, o Estado perdeu mais de 12 mil produtores de leite nos últimos anos, o que corrói a economia de pequenos municípios. A cadeia do leite movimenta mais de R$ 20 bilhões por ano e representa cerca de 8% do PIB agropecuário estadual. Quando o preço pago ao produtor despenca, o impacto atinge o comércio local, o transporte e a arrecadação municipal.
“Não se trata apenas de proteger um setor. É defender famílias, empregos e a economia regional. O leite sustenta cidades inteiras”, afirma Paparico Bacchi. Além da concorrência desleal, o setor enfrenta outro agravante: o leite importado está sendo utilizado para reconstituição e vendido como leite fluido nas prateleiras, sem que o consumidor saiba sua origem. Para Paparico Bacchi, a prática coloca o produtor gaúcho em total desigualdade.
Na articulação para a audiência em Passo Fundo, Paparico uniu os principais estados produtores de leite do país. Nesta semana, em Brasília, ele se reuniu com os deputados Luís Corti, do Paraná, e Altair Silva, de Santa Catarina, autores de projetos semelhantes em seus estados. No Paraná a proposta já é Lei. Em Santa Catarina, o projeto está em fase final de votação. Juntos, os três estados respondem por mais de um terço da produção nacional de leite e reúnem cerca de 140 mil famílias produtoras.
Após o encontro, Corti afirmou que a articulação representa a formação de uma bancada do leite no sul do Brasil. Altair Silva destacou que o endividamento tem sido um dos principais fatores de abandono da atividade e que muitos produtores só conseguem crédito colocando a propriedade como garantia. “O produtor já perdeu renda, perdeu competitividade e agora corre o risco de perder a própria terra. Vamos a Passo Fundo para construir soluções. Esta audiência não é um ato político. É uma reunião de trabalho para salvar uma cadeia essencial”, declarou.
Paralelamente ao projeto que proíbe a reconstituição, os parlamentares atuam em outra frente: a defesa da criação de um preço mínimo nacional para o leite, nos moldes do que já ocorre com arroz, trigo e feijão. A medida busca dar previsibilidade à atividade e impedir que oscilações de mercado inviabilizem a produção.
Paparico Bacchi afirma que a audiência será o início de um movimento nacional em defesa da cadeia produtiva do leite. “Se não reagirmos agora, o Brasil voltará a ser dependente de leite importado. E quando um produtor abandona a atividade, dificilmente retorna. A audiência de Passo Fundo não é apenas um debate. É o primeiro passo de uma mobilização para salvar milhares de famílias e preservar um setor estratégico para o país.”