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Política

Comissão de Direitos Humanos do Senado debate reforma da Previdência

Comissão de Direitos Humanos do Senado debate reforma da Previdência
Edilson Rodrigues/Agência Senado
  • 12/08/2019 - 22:40
Pontos da reforma da Previdência (PEC 6/2019) foram debatidos por representantes do governo e de sindicatos em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos (CDH) nesta segunda-feira (12). Houve críticas à ideia de que o Senado poderá aprovar o texto de maneira sumária e colocar alterações em uma PEC paralela, a ser aprovada também pelos deputados.
Na presidência do debate, o senador Paulo Paim (PT-RS) mostrou preocupação com a hipótese de alguns partidos entenderem que toda a discussão da reforma já teria se esgotado na Câmara.
— O Senado tem apenas carimbado propostas e medidas provisórias, alegando não haver mais tempo para o debate. Isso tem levado o Supremo Tribunal Federal (STF) a fazer o papel de revisão que originalmente cabe ao Senado.
De acordo com Paim, isso aconteceu com a reforma trabalhista, na aprovação da Emenda Constitucional 95 (Novo Regime Fiscal) e agora deve acontecer com a MP da liberdade econômica [MP 881/2019].
— Se o Senado só carimbar a PEC 6, vai estar dando um tiro no pé, porque essa reforma da Previdência sem dúvida nenhuma trará prejuízo para todos os trabalhadores, do campo e da cidade, aposentados, pensionistas ou não.
O presidente da Sociedade Brasileira de Previdência Social, José Pinto da Mota Filho, também criticou a proposta de aprovar o texto sem ampliar a discussão antes.
— Não queremos PEC paralela. Quem garante que quando chegar na Câmara ela vai ser aprovada? O Senado deveria fazer os ajustes necessários.
De acordo com Mota, não há uma proposta do governo em relação ao financiamento do sistema, uma vez que o caráter solidário e público estaria sendo extinto, de forma que a Previdência deixaria de ser social e passaria a ser individual, com a implantação de um regime de capitalização baseado na capacidade de aporte do trabalhador.
— Não se trata de ser contra ou a favor da reforma, mas de como essa reforma pode ser feita sem sacrificar quem já tem pouco.
Para ele e outros convidados, o peso maior da reforma recai sobre os mais pobres, que começam a trabalhar mais cedo por necessidade e falta de acesso à educação, e por isso superarão em muito o tempo de contribuição, apenas esperando a idade mínima de aposentadoria.
Representante do governo na audiência, o subsecretário de Previdência do Ministério da Fazenda, Narlon Gutierre Nogueira, rejeitou essa tese. Segundo ele, proporcionalmente o maior impacto per capita da reforma está sobre os servidores públicos e sobre os que têm remuneração mais alta, inclusive os do Regime Geral. Enquanto este tem 30 milhões de brasileiros, o Regime Próprio dos Servidores reúne cerca de 1,5 milhão de contribuintes.
Nogueira explicou que hoje a Previdência Social consome mais de 60% do Orçamento da União. Somando-se as despesas de pessoal, o percentual vai a 80%. Isso deixa a capacidade de investimento do Estado muito pequena.
Por causa da redução nos nascimentos e da maior expectativa de vida, com crescimento da população de idosos, a despesa previdenciária vem crescendo. Em 2015, ela representou 12% do PIB. Em 2018, chegou a 14,6%. Sem aprovar a reforma, a projeção é de 18% do PIB destinados à Previdência em 2040; e 23% do PIB em 2060.
O deficit previdenciário vem se alargando. Em 2018, segundo Nogueira, o rombo no Regime Geral foi de R$ 195 bilhões, e neste ano deve crescer para R$ 218 bilhões. No Regime Próprio dos servidores, o deficit foi de R$ 46 bilhões no ano passado e é estimado em R$ 53,5 bilhões neste ano. O deficit total da Previdência no ano passado, considerando as pensões militares e o Fundo Constitucional do DF (FCDF), foi de R$ 265 bilhões, e neste ano deve se aproximar de R$ 295 bilhões.
O impacto esperado com a reforma da Previdência, da maneira como aprovada pela Câmara, é de uma economia de R$ 933 bilhões em dez anos.
No debate, o representante dos auditores fiscais (Anfip), Vilson Antônio Romero, lamentou a forma como “o trator conservador neoliberal” fez a Câmara consolidar a PEC 6/2019.
Ele afirmou que a proposta representa "uma abrangente desconstitucionalização do direito previdenciário”, porque delega a leis complementares requisitos como idade mínima, alíquota de contribuição e equacionamento do deficit atuarial, entre outros. Ele também disse ser falsa a ideia de que a capitalização tenha sido retirada da PEC.
— O filé da capitalização é o fundo de pensão dos servidores públicos, e ele permaneceu, abrindo mercado para as entidades abertas de previdência complementar. O que o mercado deseja é entrar nos fundos de pensão como Funpresp e nos fundos de pensão dos municípios, por exemplo.
 
Representante do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), Diego Cherulli sustentou que a reforma piora, para o trabalhador, a regra atual do fator previdenciário. Isso porque atualmente ele leva em conta a média das 80% maiores contribuições. Pela PEC, passam a ser consideradas 100% das contribuições (o que incluirá também as mais baixas). Cherulli explicou que, especialmente para os autônomos inscritos no Regime Geral, essa média será puxada para baixo, uma vez que as contribuições são voláteis e dependem da saúde financeira da empresa em dado momento e da capacidade do seu proprietário de planejar as contribuições.
Cherulli levou quatro exemplos reais de pessoas que contribuem tanto com o teto do Regime Geral quanto com contribuições sobre salários mais baixos. As perdas, de acordo com os cálculos apresentados por ele, vão de R$ 500 a quase R$ 1 mil no benefício mensal de aposentadorias e pensões, dependendo de cada situação.
Ao avaliar os casos concretos, o senador Paim disse ser inaceitável a situação de uma pessoa que ganha menos de R$ 1,6 mil e que, no ato da aposentadoria, perde R$ 570 antes garantidos pelas regras atuais.
— Isso tem um enorme impacto nessa renda familiar. E essa é a reforma da Previdência, que ninguém explica direito — avaliou o senador Paim.
Cherulli concluiu que a distribuição de renda da Previdência está sendo drasticamente reduzida com o novo texto. Para ele, ainda é preciso discutir pontos como cálculo dos benefícios (especialmente os imprevisíveis); pensão por morte inferior ao salário mínimo; contribuição dos inativos acima do salário mínimo; a integralidade e paridade do Regime Geral apenas após 62 e 65 anos; excesso de regras transitórias por lei ordinária ou complementar; e o fim da aposentadoria especial, principalmente para mulheres.
Especiais
A mudança na aposentadoria especial foi questionada por vários convidados. A vice-presidente da comissão de Previdência da OAB/RS, Maíra Custódio Mota Guiotto, afirmou que esse benefício está sendo “praticamente extinto” da nova Previdência.
— Isso implica a exclusão de uma classe de trabalhadores que expõe sua saúde e integridade a riscos cotidianos em atividades necessárias para nosso mercado produtivo de bens e serviços.
Maíra lembrou que a aposentadoria especial é protegida pela Constituição, mas sofreu muitas alterações ao longo dos anos, sendo cada vez mais restrito o seu acesso. Ela explicou que as pessoas se aposentam mais cedo para que o trabalho não chegue a debilitá-las a ponto de precisarem de aposentadoria por invalidez ou de morrerem precocemente.
Ela explicou que hoje em dia o cálculo da aposentadoria especial é 100% da média ponderada (onde considera-se apenas 80% das maiores contribuições) e não se aplica o fator previdenciário. A nova Previdência, no artigo 19 (das regras de transição), assegura a aposentadoria especial a quem comprove o exercício de atividade com exposição a agentes prejudiciais à saúde (químicos, físicos e biológicos), mas veda tanto a caracterização por categoria profissional (obriga a individualização) quanto o enquadramento por periculosidade — ou seja, retiraria, para ela, a proteção à integridade física do trabalhador que se expõe, por exemplo, a explosivos, energia elétrica, inflamáveis e vigilância patrimonial.
Maíra também destacou que a idade mínima para aposentadoria especial não seria compatível com os tempos mínimos de contribuição previstos pela PEC. Um mineiro, por exemplo, precisaria de 15 anos de contribuição para se aposentar, mas a idade mínima prevista seria de 55 anos.
— Ou seja, se ele começou a trabalhar aos 20, poderia se aposentar aos 35. Mas vai precisar passar mais 20 anos esperando a idade mínima. Não faz sentido.
Precarização
O temor do representante do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômico (Dieese), Max Leno de Almeida, é que a Previdência acabe sendo vista como inatingível a ponto de o trabalhador ser levado ao mercado informal ou à precarização do trabalho — situações em que é mais difícil o recolhimento da contribuição previdenciária.
Essa também é a opinião e do secretário de assuntos jurídicos da CUT, Valeir Erthle. Para ele, a Previdência já vem sofrendo o impacto da precarização do trabalho e agora ela pode virar constitucional.
Para exemplificar, ele citou o trabalhador rural que trabalha por temporada, na época da colheita, num trabalho intermitente e precário.
— Ou esse trabalhador completa a quantia do próprio bolso para atingir o mínimo para contribuir ou junta o trabalho de dois ou três meses para pagar um mês de contribuição — disse Erthle.
Ele criticou a manutenção da pensão de filhas de militares, em detrimento das perdas de todas as categorias de trabalhadores. Também disse que é injusto parlamentares optarem por qual regime vão querer. Para ele, juízes e procuradores deveriam estar na mesma Previdência.
— Os juízes, os grandes salários, os procuradores, os privilegiados não estão nessa reforma. Nós vamos todos voltar a ser escravos — reclamou o representante da CUT.
Fonte: Senado Federal